À esquerda o Hayek e do seu lado o grande ''parsa" Mises (ambos austríacos). |
O bom austríaco Ludwig von Mises certa vez disse que “a história só ensina àqueles que sabem como
interpretá-la com base em teorias corretas”.
Caramba! Esse Mises era ruim demais com frases de
efeito... Deixo uma do Paulo Freire bem melhor: “A teoria sem a prática vira ‘verbalismo’, assim como a prática sem
teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-se
a práxis, a ação criadora e modificadora da realidade.”.
Pronto, agora
está melhor.
Graças às intuições de Murray N. Rothbard (sim, esse
economista usava “intuição” para analisar questões econômicas), ele achava que
a crise de 29 foi “culpa” do efeito líquido docontinuum Roosevelt das
políticas públicas foi ‘piorando’ a crise e prolongá-la quase até o fim da
década de 1930. A Grande Depressão foi uma falha do estado hiperativo, não
do capitalismo, segundo ele. Não ria, ele escreveu isso no livro “Anatomia do
Estado”.
Então,
sendo assim, vou contar algo bem divino a vocês:
Primeiro vou lhes confessar rapidamente como o
“Deus-mercado” abandonou seus fiéis na Grande Depressão de 29. O Santo-Estado
foi obrigado a intervir.
A intervenção do Estado na economia foi a solução
encontrada para acabar com a crise de 1929, que foi o chamado New Deal. No
governo de Franklin Delano Roosevelt, foi colocado em prática o plano. De
acordo com o plano econômico, o governo norte-americano passou a controlar os
preços e a produção das indústrias e das fazendas. Com isto, o governo
conseguiu controlar a inflação e evitar a formação de estoques.
Até a Crise de 1929, a economia era liberalista, onde
dizia-se que a economia não precisaria da intervenção do Estado. A economia
teria algo chamado “Mão Invisível”, onde ela mesma se regula. A crise de 29 foi
a prova que isso não funciona perfeitamente.
Após o Crash, houve uma ação, desenvolvida pelo
economista britânico John Maynard Keynes, onde faziam com que a população
trabalhasse em construções de praças e outros bens públicos, ganhasse um
salário, mesmo que pouco, e assim compravam os produtos.
Provou-se que há a necessidade de que o Estado seja um regulador econômico,
analise de forma macroeconômica e identifique onde precisa de ajustes. Um
exemplo claro seria na taxa Inflacionária, que é gerado quando há um consumo
maior que a oferta, gerando aumento nos preços. Assim o governo intervém
buscando, através de aumento de impostos, a diminuição do consumo.
Agora
podemos contar sobre o Reino Encantado do livre-mercado:
De acordo com a teologia ‘libertária’ ou ‘liberal’, o
livre-mercado é sempre mais eficiente do que qualquer forma de “socialismo” ou
intervenção governamental, como os serviços de saúde gratuitos adotados por
certos países. Muito belo, ou não.
Ainda segundo essa
mitologia, isso acontece porque num mercado livre no qual todos os agentes
envolvidos são privados e a intervenção estatal é mínima ou nula os mecanismos
de incentivo e a competição promovem a competição e elevam a produtividade,
reduzindo os custos. Foi com base nesse dogma que os Estados Unidos – o
contrário da maioria dos outros países desenvolvidos - se recusaram a programar
serviços de saúde gratuitos (“single payer universal health care”).
Naquele país, a maioria dos
cidadãos paga plano de saúde particular e mesmo assim frequentemente os planos
não cobrem tudo, sendo que é comum pessoas morrerem por não poder pagar
quimioterapia ou mesmo venderem a própria casa para pagar uma conta de
hospital, coisa que jamais acontece com italianos, noruegueses, canadenses,
australianos ou franceses – mesmo os mais pobres.
Observe que nos países que
possuem serviços de saúde gratuitos, teoricamente (de acordo com os
‘liberais’/libertários), os gastos per capita com saúde deveriam
ser mais altos, uma vez que os tratamentos sendo “gratuito”, o paciente não arcam
diretamente com os custos e, portanto, tem incentivo para abusar do sistema
nesses países. Ninguém jamais deixa de fazer tratamento por falta de dinheiro.
Tudo isso deveria elevar os custos e os gastos per capita com saúde nos países
com saúde gratuita, certo?
ERRADO! Se analisarmos o
gasto per capita com saúde de todos os países do mundo, inclusive as
sociais-democracias da Europa, o Canadá e a Austrália, descobrimos que os
Estados Unidos ocupam o primeiríssimo lugar. O cidadão estadunidense gasta em
média bem mais do que Noruega, Holanda, Alemanha, Suécia, Dinamarca e mais que
o dobro do que gastam Canadá, Reino Unido, Austrália e França. Isso é verdade
tanto em termos de gasto per capita, quanto em termos de gasto total em
proporção do PIB.
Sim,
amigos, esta é a realidade incômoda para os que têm fé inabalável na palavra da
profetisa judia Ayn Rand e no Deus-mercado!
A realidade não corrobora
sua mitologia. Tanto é verdade, que a principal demanda dos eleitores na atual
campanha eleitoral nos EUA é nada menos que saúde pública gratuita para
todos. Lembre-se disso a próxima vez que alguém repetir aquela frase de efeito
da queridinha Margareth Thatcher que “o socialismo dura até acabar o
dinheiro dos outros”. A propósito, não consta que os canadenses, suecos e
australianos financiem seus serviços de saúde com o “dinheiro dos outros”, mas
com seu próprio.
Os
fracos pressupostos filosóficos de Mises:
O principal livro de Ludwig
Von Mises, “A Ação Humana”, não
tem este nome à toa. A economia, ao contrário da história, segundo ele, não é
uma ciência do passado e dos dados já acabados. O homem é um ser de ação, e até
quando não age sua inação é uma escolha. Ação pressupõe desconforto, a
tentativa de migrar de uma situação menos satisfatória para uma melhor, segundo
uma avaliação subjetiva do agente.
“Racionalismo,
praxeologia e economia não lidam com as causas e objetivos finais da ação, mas
com os meios usados para a consecução do fim pretendido. Por mais insondáveis
que sejam as profundezas de onde emerge um impulso ou instinto, os meios que o homem
escolhe para satisfazê-lo são determinados por uma consideração racional de
custos e benefícios” (Ação Humana, p.40; Epistemological Problems of
Economics, p. 52).
Primeiro, não apenas as motivações externas (e internas) determinam a ação, mas também os meios externos e as capacidades próprias do sujeito; segundo, é evidente que os indivíduos pensam, mesmo que mal e parcamente, o que irão fazer o que nada mais é que um truísmo. Se, entretanto, nisso aí entra uma "consideração racional de custos e benefícios", é algo que depende inteiramente do que se busca fazer e, portanto, de todas as determinações mencionadas acima.
Sobre o nosso “economista”
autor de um livro bem vendido onde ele expõe sua ‘teoria’, intitulado “A Ação Humana”, ele explica assim sua
teologia, digo, PRAXEOLOGIA:
“A praxeologia é uma ciência teórica e
sistemática, e não histórica. Seu escopo é a ação humana e independe de
qualquer circunstância ambiental, acidental e individual. [...] Suas afirmações
e proposições não são derivadas através da experiências. São, como a lógica e a
matemática, à priori. Não estão sujeitas à verificação ou falsificação baseada
na experiência ou em fatos.”
Para quem quiser conferir, essa peripécia dele está escrita na seção 1 do capítulo 2 da Parte 1 do tal livro. Ludwig von Mises ainda afirmou que a demanda determina a oferta, ou seja, o consumo determina a produção, através de um exemplo trivial para refinados economistas de boteco:
“Não é porque existem destilarias que as
pessoas bebem uísque; é porque as pessoas bebem uísque que existem destilarias”.
Muito sagaz ele com esse
exemplo. Porque antes de haverem destilarias, as pessoas bebiam o uísque que
jorrava da terra. E depois, para estimular a emergência da existência do
uísque, resolveram inventá-las...
Primeiro que não existem
ações sociais puramente reflexivas. Toda ação social é uma síntese de múltiplas
alternativas, experiências e determinações de cada indivíduo. O erro da
praxeologia é justamente o de considerar uma ação social ahistórica,
apriorística, sem sua fundação material, com base unicamente na finalidade da
mesma. Isto é, desconsiderando todas as alternativas, experiências,
determinações, possibilidades e potencialidades que geram uma e não outra ação
social desse e não daquele indivíduo. O acúmulo social se daria por meio dessa
constante situação de busca por um estado de ser mais satisfatório para o
indivíduo. Um completo subjetivismo que ignora os processos sociais (e até
biológicos) na dinâmica da evolução do homem.
Segundo que Mises advogava
pelas liberdades plenas de mercado livre de qualquer governo na economia, porém
diz que todo indivíduo deverá ajustar suas ações segundo as leis do mercado
caso queira ser bem sucedido. Ele é explícito ao dizer que a desigualdade é
essencial para o funcionamento da economia de mercado (p. 347-9 da obra ‘Ação
Humana’), cujo livre funcionamento seria por sua vez o pilar fundamental para a
sociedade livre. Contudo, parece reconhecer que todos os indivíduos estarão sim
constrangidos por forças externas nessa sociedade. Essa força externa seria o
mercado, cujo funcionamento normal contém diversos riscos potenciais de abuso
de poder. Em alguns enxertos Mises percebe o problema, mas não o questiona
devido às suas definições filosóficas feitas a priori.
A patranha mal arrumada do senhor Mises:
“O objetivo da praxeologia é o conhecimento válido para todas as situações onde as condições correspondam exatamente àquelas indicadas nas suas hipóteses e inferências. Suas afirmativas e proposições não derivam da experiência. São como a lógica e a matemática. Não estão sujeitas a verificação com base na experiência e nos fatos. São tanto lógica como temporalmente anteriores a qualquer compreensão de fatos históricos.” (Mises, Ação Humana, p. 59).
Esta afirmativa é a antítese
perfeita para um historiador, um antropólogo, etc. para seus estudos. É
claramente a negação da História. Isso sem falar de um relativismo desgraçado
que ele ideologizou como “pressuposto de filosofia”.
Formulando as premissas da
teoria e tentar estabelecer um padrão lógico do que se pretende:
1) O ser humano toma ação para melhorar sua situação;
2) Essa ação é despida de seu caráter "histórico, sociológico, cultural,
etc", numa tentativa de estudá-la em sua forma pura;
3) Influências externas condicionam a ação humana;
4) Nem toda ação humana busca melhorar a situação do indivíduo.
5) A economia pode ser estudada a partir das deduções lógicas derivadas dessas
premissas.
O que chama atenção logo de cara é que duas das premissas estão em contradição. A premissa 1 e a premissa 4 são conflitantes. O ser humano age para melhorar sua situação, mas nem toda ação do ser humano busca melhorar sua situação. Ou o conceito foi mal definido, ou ele é contraditório em si mesmo. A finalidade é uma das últimas determinações na ação humana, temos um leque variado de determinações para a ação antes de pensar na finalidade. Na maior parte do tempo agimos de acordo com as "imposições culturais", com as regras sociais e com as leis do mercado.
Como já citado de maneira
implícita, a ação humana é determinada, principalmente, pela condição
histórica, social, cultural, econômica, etc. que o indivíduo se insere. As
possibilidades materiais no nosso desenvolvimento determinam nossas
potencialidades e, quando mais alternativas temos de apreensão da riqueza
social ao longo do nosso processo de desenvolvimento, mais potencialidades
desenvolveram e mais alternativas teremos para determinar nossa ação. Um
exemplo bem claro é uma comparação simples: No Brasil, nossa principal força
esportiva é o futebol. Na Coreia do Sul, a principal força esportiva são jogos
eletrônicos, eSports (com exceções, obviamente). Não por acaso, o jogo
eletrônico que o Brasil mais se dá bem a nível mundial é o Counter Strike, jogo
que marcou gerações que frequentavam lan
houses. Se isso não é uma determinação histórica, social, cultural e
econômica que possibilita o desenvolvimento de um tipo específico de
potencialidade, é um presente de Deus para o povo brasileiro... Ou seja, a
premissa 2 invalida as conclusões tiradas na análise da ação humana em sua
forma pura, pois a forma pura da ação humana, isto é, a essência da ação,
reside justamente em seu caráter histórico, social, cultural e economicamente
determinado.
A premissa 3 entra em
confronto com a premissa anterior. Se influências externas alteram a ação
humana, pretender estudá-la em sua forma pura a partir de um exercício
intelectivo de abstração completa dessas mesmas influências externas invalida
esse estudo. O que leva os seres humanos a agir é uma síntese de motivações
objetivas e subjetivas, portanto a forma pura da ação humana, a essência do que
leva o ser humano a tomar ação tem que ser estudada dentro dessas determinações,
ou não é um estudo que apreende a realidade do objeto.
Se todas essas estão
mistificadas ou, no mínimo, equivocadas, é desnecessário dizer que as deduções
lógicas a partir dessas premissas para poder estudar a economia obviamente
cairão em mais equívocos que, por sua vez, invalidarão o estudo dessa economia.
Nem entro no mérito da perspectiva de classe explicitamente delimitada da praxeologia, ficaremos só em termos teórico-epistemológicos mesmo.
Para finalizar, destaco que,
nas últimas linhas da obra, Mises procura explicar os fatores externos que
restringem a liberdade de escolha. No entanto, após destacar as restrições
físicas (inevitáveis por natureza) e as “leis praxeológicas” (relações de causa
e efeito existentes na cabeça), o austríaco destaca a inter-relação do
indivíduo com o meio ambiente (?), porém considera nosso conhecimento sobre
esse intercâmbio muito impreciso. Curioso, não? Quando o ideólogo passa a
considerar o mundo concreto, síntese de múltiplas determinações, existente para
além das vontades e desejos humanos, ele prefere dizer que não existe precisão
suficiente. Talvez porque, necessariamente, lidar com o mundo tal como ele é,
um todo articulado, excluísse a possibilidade de trabalhar com abstrações
puras, vazias, situadas no reino das ideias pairando no éter.
Segue o trecho:
“A liberdade de o
homem escolher e agir sofre restrições de três tipos. Em primeiro lugar, estão
as leis físicas a cujas inexoráveis determinações o homem tem que se submeter
se quiser permanecer vivo. Em segundo lugar, estão as características e
aptidões congênitas de cada indivíduo e sua inter-relação com o meio ambiente;
tais circunstâncias, indubitavelmente, influenciam tanto a escolha dos fins e a
dos meios, embora nosso conhecimento de como isso se processa seja bastante
impreciso. Finalmente, existe a regularidade das relações de causa e efeito
entre os meios utilizados e os fins alcançados; ou seja, as leis praxeológicas,
que são distintas das leis físicas e fisiológicas.”(“A Ação Humana”, pág. 999).
Mises, em sua “praxeologia”, uma ideia dedutiva da ação
do homem na Natureza para determinar seus princípios econômicos (uma
pseudociência), sequer se ateve em dados empíricos e, provavelmente, Mises é
apenas um ‘escritor’ de botequim para refinados ‘anjos’ das “trocas
voluntárias” (porra, Hayek, para quê isso?) em um sistema coercitivo, no qual
nem em seu país ele é reconhecido, muito menos na academia. O que se tem é jovem
‘intelectuais’ de Internet tentando usar suas ideias e difundi-las no Reino
Encantado do livre-mercado teológico.
Nota: partes do texto é composto por comentários de colegas coletados da Internet.
Atualizado no dia 01/03/17.
Atualizado no dia 01/03/17.
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