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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

A ideologia do mundo “pós-humano”: introdução à crítica ao racionalismo formal




Um texto recentemente publicado no site Universo Racionalista intitulado: “O mundo pós-humano”, que é uma tradução de uma entrevista com Yuval Harari, um historiador Israelense. De cara o título foi “chamativo”. Nesse sentido, resolvi ler, pois nada melhor que se deparar com o fantasma para ver o quanto podemos entrar em pânico.

Mas esse artigo não é apenas um comentário superficial sobre o artigo-entrevista, mas um diálogo crítico sobre este artigo postado originalmente no site The Atlantic. Assim, os argumentos em oposição têm como finalidade rebater falácias e devaneios idealistas sem conexão com o mundo real tal como ele está nesse processo histórico.

O texto começa de forma sofrível, algo surreal. Parece que o autor esteve encubado 3 séculos e só agora veio a “sentir” e viver o mundo real:

“Fome, epidemias e guerra. Estas três coisas têm sido as desgraças da história humana. Mas hoje, na maioria dos países é mais provável que as pessoas morram por comer demais do que comer muito pouco, mais provável que morram de velhice do que uma grande epidemia e mais provável que cometam suicídio do que morrerem em uma guerra.

Com fome, epidemias e guerra em declínio – ao menos por agora – a humanidade vai voltar seu foco em atingir imortalidade e felicidade permanente, de acordo com o novo livro Homo Deus de Yuval Harari. Nas outras palavras, nos transformarmos em deuses.”.

O trecho sobre a fome é completamente arbitrário e desconexo da realidade. Vejamos: hoje no topo da pirâmide social aproximadamente 1% concentra o grosso da riqueza e possui privilégios como isenções de impostos. Ainda na parte de cima da pirâmide outro setor social tem relações estreitas com o 1%  possui rendas polpudas; vive no luxo e detém altos cargos de prestígio, como detentores do Estado. Na base da pirâmide social encontram-se os trabalhadores, os desempregados, os camponeses, os pequenos comerciantes, que trabalham, pagam altos impostos e sustentam a parte de cima da pirâmide.


Tudo isso semelhantemente ao contexto da Europa pré-revolução francesa de 1789!


Segundo a OMS, 18 milhões de mortes por ano devido à pobreza, a maioria delas de crianças com menos de cinco anos. E a UNESCO afirma que 774 milhões de adultos são analfabetos (www.uis.unesco.org). Segundo a FAO, 1,02 bilhão têm desnutrição crônica (FAO, 2009).

Doenças como a tuberculose, no entanto, não ficou no passado. Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), um terço da população global está infectado com a bactéria Mycobacterium tuberculosis (o bacilo de Koch)  — mas apenas uma pequena parcela desenvolve a doença. Em 2012, 1,3 milhão de pessoas que contraíram a bactéria morreram. (Detalhe: somos próximos de Sete bi neste ano de 2017.)

Sobre a afirmativa que é “mais provável que comentam suicídio que morrerem uma guerra”, ainda no fim do século 19 o sociólogo David Émile Durkheim dizia que o mundo moderno era um mundo em anomia, um mundo onde as dimensões sociais estariam tão instáveis que as pessoas começariam a sentir um mal-estar, o qual, em grandes proporções, poderia causar um colapso social. As normas sociais são extremamente rígidas, reprimindo e levando a pessoa ao desespero. Daí vem a noção de fatalidade: embora a pessoa esteja com os laços sociais fortes, ela não se sente confortável, o que a leva a cometer suicídio, por exemplo. Na nossa sociedade contemporânea esse tipo de suicídio é muito comum em pessoas que sofrem preconceitos. E é justamente o que temos hoje contrariando as “expectativas” do autor.

Em suma, é uma mentira que a fome está em declínio. E é parcial verdade que as “guerras [estão] em declínio”, pois se olharmos o continente que registrou em 2007 o maior número de conflitos armados foi a Ásia, com seis enfrentamentos: Afeganistão, Índia (região da Caxemira), Mianmar, Sri Lanka e dois combates diferentes nas Filipinas. 

De um ano pra cá, três conflitos cessaram e três entraram para a lista de enfrentamentos ativos. Entre os que passaram a ser registrados estão os combates no Peru (de forças do governo contra o grupo maoísta Sendero Luminoso), nas Filipinas (entre o exército do país e a Frente Moura de Libertação Islâmica) e na Somália (entre forças do governo, com ajuda da vizinha Etiópia, e membros do grupo islâmico União das Cortes Islâmicas). 

Isso sem falar nas “guerras institucionalizadas” como as “guerras às drogas”, por exemplo. Só no Brasil, tivemos 46.881 casos de assassinato em 2014. Com 4.610 homicídios – 28 para cada 1.000 habitantes. Os dados foram revelados em um balanço publicado pelo Ministério da Justiça. O quadro geral é alarmante se comparado à taxa de homicídios da República Democrática do Congo, país africano assolado por uma guerra civil: 30,8 para cada 1.000 habitantes!


No decorrer do texto, o entrevistador Derek Thompson, lança o seguinte questionamento:

“Em Homo Deus você prediz o fim do trabalho, o fim do individualismo liberal e, até mesmo, o fim da humanidade. Vamos pegar um por um.

Primeiramente: trabalho. Você tem um modo inteligente e assustador de olhar para as implicações políticas da automação em massa. No fim do século XIX, França, Alemanha e Japão ofereceram assistência médica gratuita para seus cidadãos. Seu objetivo não era estritamente fazer as pessoas felizes, mas sim para fortalecer o potencial de suas indústrias e seus exércitos. Em outras palavras, bem-estar social era necessário porque pessoas eram necessárias. Mas você faz a temida pergunta: O que acontece com o bem-estar social em um futuro onde o governo não precisa mais de pessoas?”.

E é assim respondido por Yuval Harari: “É um cenário muito assustador. E não é ficção científica. Isso já está acontecendo.

A razão para criar todos estes sistemas de serviços sociais para o povo era para sustentar exércitos fortes e economias fortes. Agora os exércitos mais avançados não precisam de [tantas] pessoas. O mesmo pode acontecer na economia civil. O problema é a motivação: e se o governo perde a motivação para ajudar a população?

Na Escandinávia a tradição do Bem-estar Social é tão impregnada que possivelmente eles irão continuar a fornecer assistência mesmo para os cidadãos inúteis. Mas o que dizer da Nigéria, África do Sul e China? Eles são incentivados a fornecer serviços principalmente na esperança de promover a prosperidade, [que exige] ter uma grande base de cidadãos saudáveis e inteligentes. Mas tire isso e você pode ter um país com uma elite que não se importa com a população.”.

Primeiramente, o próprio entrevistador comente equívocos. A produção de mercadorias, de valores de troca, se dá por meio de relações sociais específicas, nas quais é observado que o trabalho, subsumido ao capital, produz valor em condições frequentemente precárias. O trabalhador(a) vivencia uma condição vulnerável de trabalho. Relembro aqui um trecho do capítulo XIII d’O Capital – A maquinaria e a indústria moderna –, capítulo que também poderia ser nomeado “A Revolução Industrial na compreensão de Marx”:
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“As manufaturas metalúrgicas de Birmingham e cercanias empregam, em trabalhos na maior parte pesados, 30.000 crianças e jovens, além de 10.000 mulheres. Aí são empregados em atividades insalubres, nas fundições de cobre, na fabricação de botões, nas oficinas de esmaltar, de galvanizar e de laquear. O trabalho em excesso a que são submetidos os adultos e os menores nas impressoras de jornais e de livros de Londres conquistou para esses estabelecimentos o famigerado nome de “matadouros”. Os mesmos excessos se encontram na encadernação de livros, e suas vítimas são principalmente mulheres, meninas e crianças. Menores realizam trabalhos pesados nas cordoarias, ou trabalham à noite nas salinas, nas manufaturas de velas e noutras manufaturas químicas. Há o emprego criminoso de menores, para rodarem os teares, em tecelagem de seda que não movidas a máquina. Um dos trabalhos mais humilhantes, mais sujos, e mais mal pagos, em que se empregam de preferência meninas e mulheres, é o de classificar trapos. Sabe-se que a Grã-Bretanha, além de possuir seus próprios estoques de trapo, é o empório mundial deste artigo. Os trapos afluem do Japão, dos mais distantes países da América do Sul e das Ilhas Canárias. Mas, seus principais fornecedores são a Alemanha, França, Rússia, Itália, Egito, Turquia, Bélgica e Holanda. Servem para adubos, para fazer estofo de roupa de cama, lã artificial e papel. As classificadoras de trapo servem para transmitir varíola e outras doenças contagiosas das quais são as primeiras vítimas” (Marx, 1980, p.530-531).

As cidades, que até o século XVIII eram centros de comércio e já contavam com certa estrutura política e administrativa, foram locais onde o aparecimento de indústrias ocorreu de forma mais rápida, pois contavam com concentração de capitais acumulados com o comércio, eram centros políticos e possuíam reservas de força de trabalho. Gradativamente, elas foram se adaptando às necessidades capitalistas e a indústria se apoiou em muitas delas, aproveitando os conhecimentos e tradições na produção que já realizavam, por exemplo: uma cidade que contava com uma produção artesanal de papel ou de tecidos foi absorvida pela indústria e se transformou em um grande centro urbano especializado nestes artigos. E ao redor do centro formava-se uma nova área, considerada periferia ou subúrbios. Neste local, surgiam bairros luxuosos para abrigar a burguesia, que fugia do ar poluído, da sujeira, do mau cheiro e da multidão que vivia no centro, estes procuravam lugares mais abertos, com áreas verdes, ruas arborizadas. Surgiam bairros habitacionais para os operários recém-emigrados do campo e, também, eram construídas áreas industriais maiores.

Ou seja, nada diferente do que é hoje. Sua base ideológica era de garantir a liberdade de empreendimento e suas propriedades, queriam lucro sem se preocupar com as consequências, com isso pensavam as cidades sem intervenção do governo (em suma uma administração liberal da cidade).

Harari argumenta que “O problema é a motivação: e se o governo perde a motivação para ajudar a população?”, o que é, no mínimo, sem fundamento, pois “motivação” em si é uma terminologia fraquíssima tendo em vista que, segundo Engels escreve, em “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”:

“O Estado não é, pois, de modo algum, um poder que se impôs à sociedade de fora para dentro; tampouco é "a realidade da ideia moral", nem "a imagem e a realidade da razão", como afirma Hegel. É antes um produto da sociedade, quando esta chega a um determinado grau de desenvolvimento; é a confissão de que essa sociedade se enredou numa irremediável contradição com ela própria e está dividida por antagonismos irreconciliáveis que não consegue conjurar. Mas para que esses antagonismos, essas classes com interesses econômicos colidentes não se devorem e não consumam a sociedade numa luta estéril, faz-se necessário um poder colocado aparentemente por cima da sociedade, chamado a amortecer o choque e este poder, nascido da sociedade, mas posto acima dela se distanciando cada vez mais, é o Estado.” ENGELS, p.191).


A seguir na entrevista, o diálogo:

“Thompson: O último ponto é interessante, porque, na Europa e Estados Unidos, o oposto parece mais verdadeiro: a população não se importa, ou acha que não precisa, com a elite. Isso é parte de como tivemos Trump e o Brexit. Agora também tem estas reações da direita radical contra o establishment que percorre por toda a Europa. Por que isso está acontecendo agora?

Harari: Esta é a grande pergunta. Eu não previ isso vindo. Não é minha especialidade analisar a situação política nos EUA ou Europa. Mas se você olhar para a condição objetiva de saúde e coisas do tipo, a maioria das pessoas nos Estados Unidos e Europa Ocidental têm melhores condições do que costumavam ter. Mas elas sentem que estão sendo deixadas de lado e perdendo poder. E elas têm medo que suas crianças tenham uma vida pior do que elas têm hoje. Eu acho que estes medos possam ser justificados. Mas eu não acho que o antídoto vai funcionar. Trump não ajudará os eleitores do Alabama a recuperar seu poder.”

Aqui está a total fragilidade dos personagens. Ambos não conseguem analisar o concreto, o real. Tanto é que Harari afirma que “Não é minha especialidade analisar a situação política nos EUA ou Europa.”, e usa da “saúde” para um apelo infundado. Isto se torna claro porque a principal demanda dos eleitores na atual campanha eleitoral nos EUA foi nada menos que saúde pública gratuita para todos já que os valores que o cidadão estadunidense gasta em média bem mais do que Noruega, Holanda, Alemanha, Suécia, Dinamarca e mais que o dobro do que gastam Canadá, Reino Unido, Austrália e França. Isso é verdade tanto em termos de gasto per capita, quanto em termos de gasto total em proporção do PIB.

Em apenas 50 anos, os moradores das cidades terão sido multiplicados de 1,5 bilhão para 5 bilhões de pessoas – o equivalente a 500 mil cidades de São Paulo. Isto indica que, apesar das previsões de que as novas tecnologias de informação e a acumulação e problemas nas metrópoles implicariam a desarticulação da vida urbana, a cidade absorveu as mudanças e ainda é o motor do desenvolvimento científico.

Mas isto tem um preço. “O número de moradores urbanos vivendo em pobreza absoluta cresceu rapidamente nos anos 80, especialmente na América Latina, África e nas economias asiáticas menos favorecidas”. O alerta consta do “Relatório Global sobre Aglomerações Humanas”, que resume o encontro (Habitat) promovido pela ONU em 1996 sobre o tema. Agravada pela globalização, a desigualdade entre cidades é um dos maiores custos da revolução urbana. O Programa do Habitat mostra que a renda média domiciliar das cidades dos países industrializados é de 38 vezes maior do que a das cidades africanas: US$ 9544 contra US$ 252 por ano. Mesmo nas cidades dos países industrializados, os 20% mais ricos têm uma renda 10 vezes maior do que os 20% mais pobres.


Após isso, a escandalosa afirmativa:

“A FELICIDADE DA MAIORIA DAS PESSOAS DEPENDE DE SUAS EXPECTATIVAS, NÃO DE SUAS CONDIÇÕES”

Isso chega a ser engraçado. É muita ‘abobrinha’ num trecho só. O trabalho racional capitalista, na perspectiva do sociólogo alemão Max Weber, exige submissão a uma nova disciplina na qual a “obrigação moral” religiosa dos trabalhadores e a necessidade financeira, constituem terrenos férteis para levar a bom termo o processo educativo necessário para a superação do tradicionalismo. Dito de outra forma, expressa a dominação da subjetividade do trabalhador submetida à pressão permanente por produtividade cada vez mais elevada de acordo com o novo “espírito do capitalismo”. Informa, sobretudo, o utilitarismo da vulnerabilidade da mulher trabalhadora, na ótica da acumulação capitalista, no processo de dominação racional e legal. Enquanto que Durkheim observa as mudanças sociais no mesmo período histórico – expansão do capitalismo e seus conflitos – e propõe outros caminhos e temas analíticos na tentativa de compreendê-las.

O que indagar no presente século XXI, para ainda tentar compreender as relações e condições de trabalho que evidenciam vulnerabilidade e precariedade no momento histórico atual? O que é possível perceber na relação entre relações de gênero e relações de trabalho (divisão social do mesmo, etc.) nessa construção social? Em outras palavras, “olhar o cardápio não mata a fome”, isto é, expectativas não existem sem condições para fazê-las.


Mais adiante, temos:

“Thompson: Americanos podem ser mais ricos e mais educados do que eram uma geração anterior, com melhores cuidados médicos e opções de entretenimento superiores, mas o fato do progresso não parece importar. A narrativa é tudo que importa. E a narrativa vitoriosa de Trump era que as cidades dos Estados Unidos estavam caindo aos pedaços e “só eu posso corrigi-las”.

Harari: [Os americanos brancos sem curso superior] são uma classe em declínio dentro de um poder em declínio. Os EUA estão perdendo poder em comparação com o resto do mundo, e dentro dos EUA, os eleitores Trump estão perdendo seu status. Mesmo que eles estejam experimentando melhores condições, a narrativa que é dominante na maioria das pessoas conta uma história de declínio, que diz que o futuro será pior do que o presente. E a felicidade da maioria das pessoas depende de suas expectativas, não de suas condições.”.

A afirmação de Thompson aqui novamente se mostra mentirosa ou ignorante. Não é de estranhar que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, admitisse em uma passagem pela Espanha que a desigualdade alimenta o populismo. O relatório sobre a economia norte-americana, o FMI enumera um panorama desolador nesse aspecto: a pobreza continua aumentando, a classe média encolheu a níveis da década de oitenta, a distribuição da renda e da riqueza se encontra altamente polarizada, e a porcentagem de rendimentos do fator trabalho é 5% mais baixa do que há quinze anos.  

Publicado no jornal El País, “Todos os avanços conseguidos para reduzir a pobreza desde os anos 90 se diluíram”, afirma a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde. Como se não bastasse, um em cada sete americanos vive em condições de pobreza e 40% dos pobres está trabalhando. “Se não forem interrompidas, essas forças continuarão derrubando o crescimento atual e potencial, diminuindo os ganhos em padrão de vida e aumentando a pobreza”, conclui o documento elaborado. Harari não compreende que “a felicidade da maioria das pessoas depende de suas expectativas, não de suas condições” é puro devaneio.

As tensões no processo de produção da arte concretizada por um artista burguês, por exemplo, na sociedade burguesa, são analisadas por Norbert Elias como expressão da estrutura de conflitos de padrões diferenciados de comportamentos, sentimentos, interesses entre a corte e os grupos burgueses. E as relações sociais estabelecidas nos processo produtivos ingleses informam a singularidade da apropriação, por parte do capital, da fragilidade social de alguns grupos específicos – crianças, adolescentes e mulheres –, possibilitando sua sujeição ao trabalho precário. Já naquele momento histórico, é evidenciado que a internacionalização do capital se articula com as formas manifestas de precariedade traduzidas em insalubridade em diversas manufaturas (abatedouros?), excesso de trabalho e comprometimento da saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras.

O que deve ser explicado, na verdade, é o capitalismo dado como um sistema que exige uma padronização social intensa, literalmente transforma a sociedade humana em uma sociedade de abelhas: as pessoas precisam trabalhar em uma cadeia produtiva extremamente hierárquica e fechada. Todo ato e trabalho humanos nas sociedades capitalistas é realizado para manter esse sistema, seja o que nós assistimos, seja o que nós estudamos, seja como nós nos relacionamos, seja como compramos… Assim é gerada essa “falta de expectativa”, ou seja, a subjetividade da vida.


Explicado isso, partiremos para mais um trecho:

Thompson: Digamos que o futuro para a maioria das pessoas é uma renda básica universal, maravilhosas drogas psicodélicas e videogames de realidade virtual. As pessoas não passam fome. Eles não são miseráveis. Mas eles também param de lutar. As virtudes de Walt Disney (“Desafie você mesmo! Faça uma aventura!”) são sacrificadas para viver permanentemente dentro de um entretenimento no estilo Disney. É utopia ou distopia?

Harari: A maioria dos filósofos vão dizer que a sua hipótese é uma distopia. Um mundo muito pior.

Mas você poderia argumentar é que as pessoas já passam a maior parte de suas vidas em jogos virtuais. A maioria das religiões são jogos virtuais sobrepostos à realidade da vida. Faça aquilo, e há uma punição. Faça isso, e você ganha pontos extras. Não há nada na realidade que corresponda a tais regras. Mas você tem milhões de pessoas jogando esses jogos de realidade virtual. Então, qual é a diferença entre uma religião e um jogo de realidade virtual?

Recentemente eu fui caçar Pokémon com meu sobrinho. Estávamos andando pela rua e um bando de crianças se aproximaram de nós. Eles também estavam caçando Pokemon. Meu sobrinho e essas crianças entraram em uma pequena briga porque estavam tentando capturar as mesmas criaturas invisíveis. Isso foi estranho para mim. Mas esses Pokémons eram muito reais para as crianças.

E então isso me atingiu: Isto é análogo ao conflito entre Israel e Palestina! Você tem dois lados lutando por algo que eu não consigo ver. Eu olho para as pedras das construções em Jerusalém e eu só vejo pedras. Mas cristãos, judeus e muçulmanos que olham para as mesmas pedras veem uma cidade santa. É a imaginação deles, mas eles estão dispostos a matar por isso. Essa é a realidade virtual, também.

Sua hipótese também levanta uma profunda questão filosófica: Qual é o significado da vida? Historicamente, os filósofos investigaram questões que eram interessantes para apenas uma pequena porcentagem da humanidade.”.


O pedacinho abaixo é um show de idealismos e suposições completamente piradas. Parece-me que os dois fumaram maconha em excesso e depois tomaram chá de cogumelos em São Thomé das Letras-MG para tanta viajem!

Percebam: Mas você poderia argumentar é que as pessoas já passam a maior parte de suas vidas em jogos virtuais. A maioria das religiões são jogos virtuais sobrepostos à realidade da vida. Faça aquilo, e há uma punição. Faça isso, e você ganha pontos extras. Não há nada na realidade que corresponda a tais regras. Mas você tem milhões de pessoas jogando esses jogos de realidade virtual. Então, qual é a diferença entre uma religião e um jogo de realidade virtual?”.

Trazendo isso para o âmbito material, real, explico essa peripécia com seriedade. Por falta de noção ontológica materialista, é inevitável que seus ímpetos e anseios “de um mundo melhor” se enredem em um tanto de contradições por claramente navegar no idealismo vulgar. Pois a superação das formas de consciência que este ser tem do mundo engendra dados pelo aspecto de externalidade com o qual o mundo aparece, nisso “as leis sociais aparecem como objetividades de igual estatuto que as leis naturais”, e o mundo parece como absolutamente externo, evidentemente que a forma de consciência (que constitui uma necessidade da reprodução social) é aquela que Lukács chamou, tomando o conceito de Nicolai Hartmann, de intentio obliqua, isto é, a explicação de mundo é uma necessidade dos homens de explicarem sua vida, encontrarem sentido na sua cotidianidade, feita por explicações falsas do mundo que, no entanto, permitem aquela reprodução. Um exemplo é dado por Lukács, ao explicar como o geocentrismo servia para a orientação no mar, mesmo que não fosse um conhecimento verdadeiro. Igualmente, a forma religiosa produz um mecanismo de explicação e regulação social já que está imbricada na moral e na ética para o ser que faz dessas “leis” – religiosas – sua forma de vida. 

Assim, a comparação entre “jogos virtuais e religião” está mais para crianças do que para intelectuais que se propõem a interpretar o mundo de forma tão avacalhada, até porque, Marx categorizou como sua capacidade de “[arrancar] as flores imaginárias dos grilhões, não para que o homem suporte grilhões desprovidos de fantasias ou consolo, mas para que se desvencilhe deles e a flor viva desabroche”. Pois a religião é um sistema ideológico que fundamenta exploração do ser e por isso “a exigência de que [as pessoas] abandonem as ilusões acerca de uma condição é a exigência de que abandonem uma condição que necessita de ilusões”(Intro à Crit. do Direito, 1842). Nada mais que isso. E só isso.

Outra coisa inócua é “Qual é o significado da vida? Historicamente, os filósofos investigaram questões que eram interessantes para apenas uma pequena porcentagem da humanidade.”, nada mais falso! Falar em um “significado da vida” é tão vago quanto falar “vá estudar!”. É a subjetividade e a incapacidade de reprodução social por este agente vigorando num pensamento platônico do “ideal”. A vida só tem um sentido concreto quando estamos nela e nos fazemos parte dela, ou seja, a relação de sujeito/objeto é histórica, e ela não é uma relação que é exterior ao sujeito, o sujeito é também objeto na medida em que ele próprio faz parte do ser social. Assim, o estudo e o conhecimento não devem ser passivos, mas ativo, vivo, de modo a fazer com que se torne autoconsciente e não apenas um “intérprete” da vida cotidiana. A vida não é como pedras irremovíveis à beira de um rio. Tudo está em processo.


Passaremos, portanto, sobre o que ambos comentam na entrevista com relação a isso:

“Thompson: Certo. “Qual é a maneira ideal de buscar a felicidade?” não é um questionamento útil quando toda uma região está morrendo de epidemia.

Harari: Sim, mas uma vez que você está livre de se preocupar com fome e epidemias, isso se torna uma pergunta muito mais prática: Qual é o significado da vida? Se você projeta um carro auto dirigível, você deve planejar algoritmos éticos no caso de eles estar prestes a bater em uma criança. Deve arriscar ferir o pedestre ou o passageiro? Isso é, de repente, uma questão muito prática. Filosofia, outrora um sistema arcaico, torna-se central quando nos preocupamos com a morte e a miséria de forma generalizada.”.

Uma tonelada de besteiras em poucos períodos proferidos aqui, companheiros! O autor simplesmente “ignora” a condição material engendrada socialmente pelo que ele categorizou de “algoritmos éticos”. Um disparate!

Se um carro automatizado entra num dilema ele precisa tomar uma atitude previamente programada: salvar a vida do passageiro do próprio carro ou o humano mais novo entre os dois carros, logo, o que tem mais vida pela frente?

Entende que isso já é moral humana sendo aplicada e depende de padrões éticos e morais humanos previamente discutidos? Já não existe a partir dai a isenção. O ser humano que vai codificar não é neutro, os seres humanos que vão decidir o que a máquina tem que fazer também não são neutros. É disso que eu e os outros amigos falamos. Ninguém desacredita no poder da tecnologia, mas simplesmente Harari ignora o que estamos levantando como problemática e chama a filosofia de “outrora um sistema arcaico”.

Nesse pôr, o filósofo e professor José Chasin, afirmara com todas as letras: “Para a dialética, não existe diferença entre ciência e filosofia. Ambas são apenas momentos distintos de um mesmo saber. O saber das coisas. Então, agarrar as coisas subentenderia a existência de um vai-e-vem entre o momento filosófico e o momento científico – o filosófico como mais abstrato e o científico como mais concreto – ainda que as coisas possam ter momentos mais abstratos do concreto científico e momentos mais concretos do abstrato filosófico. Esta malha que vai se formando, busca desse perfil, desse desenho preliminar ontológico, percorrer o caminho de concreção e chegar ao objeto efetivamente concreto. Isto é, transformar a ontologia abstrata em ontologia concreta. A ontologia concreta, se pensada em termos de uma ciência autônoma, “independente”, nós temos o produto científico”. O que joga, enfim, por água abaixo toda essa groselha proferida pelo historiador Israelense...


Aqui começamos entrar na parte mais espinhosa do texto. Como Thompson faz apenas interpelação sobre “autoridade” (mesmo com erros grosseiros) podemos analisar o que Harari tentará sustentar para tornar mais objetivo à refutação do trecho:

“Harari: Eu gosto de começar com as coisas simples. Olhe para os aplicativos GPS, como Waze e Google Maps. Cinco anos atrás, você ia a algum lugar no seu carro ou a pé. Você se guiava com base em seu próprio conhecimento e intuição. Mas hoje todo mundo está cegamente seguindo o que Waze está dizendo. A habilidade básica de navegarem sozinhos foi perdida. Se algo acontecer com o aplicativo, estarão completamente perdidos.

Esse não é o exemplo mais importante. Mas está no caminho do que estamos falando. Você define um ponto no mapa, e você confia no algoritmo. Talvez o ponto seja a sua carreira. Talvez seja a decisão de se casar. Mas você confia no algoritmo ao invés de sua própria intuição.

A invenção mais importante que está se espalhando agora são sensores biométricos. Eles se tornarão bastante comuns. Os seres humanos consultarão seus dados biométricos para determinar como viver. Estes sensores são realmente interessantes e assustadores, porque nós não estaremos mais no comando da nossa identidade. Iremos terceirizar nossas decisões executivas para leituras biométricas de nossos sinais neuroquímicos para decidir como viver.”.

O autor comenta invertidamente quando diz que “todo mundo hoje está cegamente seguindo o que Wase está dizendo.”. Os smartphones são um bom exemplo de praticidade. Com eles tiramos fotos, gravar vídeos, acessar aplicativos úteis no dia a dia, acessar redes sociais e inclusive para nos locomovermos. Além do mais, a possibilidade de resolver problemas a distância usando a tecnologia é algo muito importante na atualidade. Tudo isso é útil, mas não é tudo.

Um problema grave da irracionalidade tecnológica é o lixo eletrônico. Como a principal finalidade da lógica do capital é “criar necessidades para serem supridas”, a obsolescência de aparelhos de forma rápida e substancial. Além disso, o que é produzido socialmente aqui na Terra, as tecnologias de satélites e missões espaciais estão deveras poluindo o espaço. Isso para ser simplório, não negando a relevância de algumas delas. Trata-se, portanto, toneladas de lixo espacial que degrada não só o solo, mas a vegetação e o reino animal, tudo em prol da “ciência”.

Outro ponto: no ápice da revolução industrial, o mecanicismo era um grande mal, aliado às jornadas de trabalho extensas e o trabalho exaustivo e repetitivo do homem-máquina. Isso fez com que surgissem as associações de classe para lutar pelo direito do trabalhador. Mas, veja bem, nessa época ninguém sofria de ler ou estresse. Não que esteja defendendo o modelo anterior, apenas criticando o atual num sentido em que nós criamos máquinas que nos fizeram produzir mais em menos tempo. E o que fizemos com o tempo que sobrou? Ora, produzimos mais.

Esforçamo-nos todos os dias para ganhar tempo e, infelizmente, utilizamos esse tempo para trabalhar ainda mais. Hoje temos diversas doenças ou síndromes que estão diretamente (e equivocadamente) associadas à tecnologia. Mas é o seu mal uso que acarreta em problemas. Claro que é bom locomover sem ter “erros”, mas, da mesma forma que digitamos ou pesquisamos na internet algum restaurante ou uma avenida, porque simplesmente não vivemos a realidade da busca pelo saber por si ao invés de ficar delegando toda nossa futilidade momentânea num aparelho qualquer?

A perda de autonomia por si, ao “terceirizar” ações, desumaniza o ser social cada vez mais contaminado por essa “lógica”. O professor de filosofia Erik Gontigo comenta acerca disso de forma magistral: “A desantropomorfização do homem é a humanização da natureza, tanto a que se refere ao próprio corpo e subjetividade humanos, quanto à natureza exterior ao corpo, na qual o humano se ambienta, tornada mundo. É claro que aquela expansão do poder humano não depende apenas da ciência, mas também da ação prática, do estágio de maturidade social da cognição do sujeito e também da maturação natural e/ou social do objeto. Nem todo objeto está, em si ou por si mesmo, pronto ou disponível para ser conhecido e transformado, ainda que esteja posto diante nossos narizes e nos relacionemos com ele na trivialidade do cotidiano. E nem sempre a história e a sociedade permitem ao sujeito ultrapassar os limites que elas mesmas põem a ele.”.


Nesta mesma direção seguem o entrevistado e o entrevistador, que, aqui, parecem mais robôs do que homens de carne e osso:

“Thompson: Aqui vai como eu entendo essa ideia. É o futuro, e estou com fome em uma noite de sexta-feira. Eu penso: “Eu gostaria de frango frito”. Então eu consulto minha IA assistente, que pode ler meus sinais bioquímicos e prever minhas futuras emoções, que me diz: “Na verdade, Derek, uma salada de frango vai te fazer mais feliz”. Então eu como salada.

Em uma base de caso a caso, esta tecnologia me parece maravilhosa. Está me fazendo muito mais saudável e feliz. A tecnologia está me livrando dos erros naturais da má compreensão dos meus futuros desejos e necessidades. Mas ao mesmo tempo, meu “eu” desapareceu, porque eu terceirizei minha identidade para um analista bioquímico.

Harari: Neste cenário, veremos que as decisões não vêm de uma alma mística, mas de processos biológicos no cérebro. No passado, não conseguíamos reunir os dados e analisá-los. Assim você poderia imaginar que existia uma alma mística, transcendental dentro de você que faz estas decisões. De uma perspectiva prática era uma estimativa bastante boa. Mas, uma vez que você combina uma melhor compreensão dos processos bioquímicos no corpo com o poder computacional de big data, acontece uma verdadeira revolução, porque esta noção tradicional de livre arbítrio não faz mais sentido prático e você pode ter algoritmos que tomam melhores decisões do que um indivíduo humano.”.

Porque a ciência traz “para nós” aquilo que é “por si”. Traduzindo: a ciência permite a ampliação do domínio humano sobre uma parcela da realidade até então alheia a nós e existindo sem qualquer relação conosco, ou sem que nos déssemos conta da relação que houver. A tecnologia ‘organiza’ um leque de desorganização fútil onde na desorientação perpetua-se a vagueza da vida e no conforto do ócio.

E para isso nós temos mais que o suficiente até aqui sem essa “base de cálculos”. Mas, ao inverso de nos encontrarmos mais capazes e próximos de humanizar a sociedade, estamos nos afastando desse dever – absolutamente imperioso e necessário e, também, importante, abarrotado de sentido e valor – em alta velocidade e na disritmia de aviltante aceleração, perigosamente desorientados e sordidamente enfraquecidos, rumo ao pleno humanicídio ou à completa torpeza de uma deterioração total da humanidade ao patamar da selvageria. Qualquer avaliação sobre o que seria pior é problemática.

Mas a realidade não é apenas a realidade objetiva, de acordo consigo mesma. O mundo humano possui também um aspecto subjetivo: a realidade de acordo conosco. E é aqui que entra a expressão artística humana, por exemplo.

Quando ambos falam de “analista bioquímico”, “’eu” desaparecido’” e outras verborragias mais, comparando-nos com um sistema computacional é a síntese da ignorância ontológica! Por isso mesmo é que uma sociedade e individualidade autenticamente humanas, apuradas em todos os sentidos, gozando de riqueza de corpo e alma, pensamento e ação multifacetados, materialidade e espiritualidade verdadeiramente refinadas e integralmente conciliadas – demanda urgentemente uma revolução social radical, dolorosa, ampla, profunda, morosa e duradoura. A mais difícil tarefa já posta ao homem em toda a sua história e, por isso mesmo, a mais valorosa. Quem renuncia a ela, renuncia a si mesmo e apodrece por baixo da própria carniça; saboreia o cultivo do miasma que preenche sua consciência e a metástase da muxiba que convulsiona em seu peito. Não nos permitamos viver sob o jugo de tais cadáveres insepultos e engravatados.

Em suma, diz o professor de filosofia Erik Gontijo: “a ciência nos humaniza. Mas a humanização do indivíduo, do mundo e da própria ciência não é uma tarefa científica”.


Depois dessa patranha mal-arrumada de decadência teórica trajada de “conhecimento científico” que mais parece dois bêbados num final de festa open-bar, passaremos para a parte final da dolorosa entrevista.

Thompson: Isso é fascinante, porque agora acho que esses algoritmos estão me deixando mais próximo de mim mesmo. Se uma pulseira fitness me incentiva a correr mais ou um algoritmo de entretenimento descobre uma música que eu amo, eu fico mais feliz. E eu prefiro estar feliz.

Mas ao mesmo tempo, minhas decisões foram reduzidas a sinais cerebrais e leitores de sinais cerebrais. “Eu” não sou especial, nem sagrado, nem mesmo indivíduo. Eu sou apenas uma embarcação para um monte de sinais que são lidos melhor por um computador. Não há espaço para “mim” nessa combinação.

Harari: O que realmente acontece é que o seu “eu” se desintegra. Não é que você compreenda melhor seu verdadeiro eu, mas você acaba percebendo que não existe um verdadeiro eu. Há apenas uma conexão complicada de conexões bioquímicas sem um núcleo. Não há voz autêntica que viva dentro de você.

Você já assistiu Divertida Mente (Inside Out, em inglês)? Para mim, esse foi o ponto de inflexão na compreensão da cultura popular sobre a mente. Durante décadas, a Disney nos vendeu a fantasia individualista liberal: Não ouça seus vizinhos ou governo, basta seguir seu próprio coração. Mas então, em Divertida Mente, você vai dentro desta menininha Riley, e você não encontra um “eu” ou uma identidade central. O que o filme mostra para as crianças e seus pais é que Riley é um robô sendo manipulado por processos químicos dentro de seu cérebro. O ponto cataclísmico da história é quando você percebe que nenhuma das emoções dentro dela é o seu verdadeiro eu. No começo você se identifica com Joy, mas o momento crítico vem quando você percebe que nenhuma dessas emoções é o verdadeiro eu de Riley. É um equilíbrio entre as diferentes emoções.

E eu acho que isso é o que vai acontecer cada vez mais e mais em um nível geral. A própria ideia de um indivíduo que existe, que tem sido tão preciosa para nós, está em perigo.”.

Aqui ambos caem numa questão fundamental: a tecnologia está diariamente presente na vida de milhões de pessoas ao redor do mundo, desde que acordamos até a hora de dormir, quando damos aquela última olhadinha no smartphone ou no tablet. Assim, carregamos esses aparelhos para todos os lados e constantemente os conferimos, seja para verificar os emails, ver mensagens do WhatsApp e notificações do Facebook, acessar as redes socais ou nos distrair com joguinhos. Quase 80% das pessoas checam os seus celulares ao acordar, e um terço dos americanos diz preferir deixar de fazer sexo a ficar sem os seus aparelhos pessoais!

Admitindo ou não, nós nos viciamos e dependentes. Fomos lenta e propositalmente viciados em tecnologias das mais variadas formas que hoje estão presentes em nosso cotidiano – um hábito já enraizado nas rotinas de milhões de pessoas!

De acordo com o pesquisador Nir Eyal, autor do livro “Hooked: How to Build Habit-Forming Products” (traduzido como “Viciado: Como Construir Produtos que Formam Hábitos”), as empresas identificam em nós o potencial de um novo hábito e tiram proveito disso. No vídeo abaixo (em inglês), é possível conferir mais sobre os conceitos apresentados por Eyal:




Por exemplo, é estimado que 40% das nossas ações realizadas diariamente são movidas por puro hábito, seja consciente ou inconscientemente. E muitas pessoas se tornam dependentes de determinados costumes, como conferir as notificações do Facebook e os próprios emails, já que podem perder algo urgente e interessante a todo o momento.  

Diferentemente do que Harari “supõe”, não há, nesse sentido, “processos químicos dentro de seu cérebro”, apenas categorias socialmente construídas pela interdependência supérflua desse mecanismo. Nada mais que uma falsa sensação de domínio do exterior, já que seu interior está corrompido por esta mesma “IA”.

Essas sensações são manipuladas para que o público fique fiel às empresas e utilize os seus produtos mais e mais. Eyal diz que quer que as pessoas ganhem mais autonomia sobre suas vidas em vez de serem somente controladas pela tecnologia – algo que o livro escrito por ele pretende esclarecer, abrindo os olhos das pessoas para as influências ao nosso redor.

O segundo passo é a ação, quando acessamos de fato aplicativos como Facebook e Instagram (estamos em busca de interação e, de algum modo, fugindo da realidade momentânea). Ao utilizarmos esses apps, temos recompensas imprecisas, já que não sabemos quais conteúdos vamos encontrar: quais fotos, que tipos de mensagens, se vamos ter novos likes ou não em nossas postagens etc. E assim se estamos entediados acessamos o YouTube. E se nos sentimos sozinhos vemos o Facebook e os perfis de amigos; se temos dúvidas sobre algo vamos ao Google – nem pensamos mais em realizar essas ações, pois elas já se transformaram em hábito e em respostas aos sentimentos que as antecedem. Para muitos, esses sites se tornaram necessários e não são somente recursos que utilizamos esporadicamente. Então, o que seria “auxilio” torna-se interdependente e superficial.


Conclusão:


A epistemologia positivista é falha porque se concentra apenas no nível dos fenômenos, por exemplo, a função da teoria para eles é meramente servir como estrutura lógica apenas eficaz para o estabelecimento de prognósticos, deixa de ser uma explicação para ser um mosaico de correlações. Sua própria prática é insustentável. Chega um momento que o pesquisador precisa trabalhar com categorias inobserváveis, não arbitrariamente, mas por necessidade de explicação. E o positivismo é diametralmente oposto as ciências sociais e, desse modo, incompatível a ela.

O companheiro Ciro Domingos argumenta que “a ideia de progresso não é necessariamente ligada à teleologia. Podemos ter uma visão teleológica que termine em decadência como podemos ter um progresso que não seja pré-direcionado. Evolucionismo e teleologia na história humana costumam se encontrar, mas não são sinônimos”.

E o mais importante: não podemos deixar escapar é o que “a relação entre ideologia e ciência de modo algum pode ser descrita, nem mesmo em termos aproximativos, mediante a proclamação de uma suposta isenção valorativa, do abster-se de fazer valorações etc. Essa tendência, que geralmente entra em cena como autodefesa de uma ‘cientificidade’ professoral tantas vezes infrutífera, na maioria dos casos se revela como pura ideologia, quando as valorações da classe ora dominante são tratadas como “fatos constatados isentos de valorações”, quando não se considera que a mais elementar escolha da temática, seleção dos fatos, por exemplo, na ciência da história, nem mesmo pode ser efetuada de modo totalmente independente de qualquer aspecto ideológico” (Lukács, em ‘Para uma ontologia do ser’).


Referências:














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