Quando se conversa sobre a
alternativa revolucionária e a crise da esquerda brasileira, não muito rápido o
oportunismo e a cretinice teórica se envaidecem.
É bem sabido que com uma “ex-querda” que não consegue enxergar
nada que ultrapasse dois palmos do nariz, o trabalho da direita se torna fácil.
Isso porque podemos até ignorar por um instante que a direita consegue a incrível
proeza de se automutilar (através de seus ideólogos analfabetos funcionais).
Na mentalidade dessas “new-lefts” bastam apenas alguns retoques
no Estado para que ele passe de “opressor” a “proletário”; ou seja, bastam-lhe tirar
as raposas que as galinhas irão tomar conta do galinheiro onde elas mesmas estão
presas. Em meio a tanta decadência ideológica (forjada exatamente no seio do
capital monopolista).
Na parte do sujeito arendtiano,
mal o sabe que a sua mentora fez uma concepção aristocrática da participação
política; isto é, “direito à propriedade” – a concepção liberal-conservadora
da sociedade. O pupilo não percebeu que ao longo de sua opinião, tendeu ao
elitismo político.
A fé do weberiano “de esquerda” é ainda mais fundamental: Weber
era um neokantiano que se preocupa na construção de “tipos ideais” generalizáveis, porque a realidade não passa de
fenômenos intransponíveis organizados e hierarquizados pela distribuição de
poder na sociedade. Tendo por base as formas de racionalidade (econômica,
emocional) nas quais os agentes se baseiam para realizarem as mais diversas
escolhas. A problemática weberiana desloca-se para o sujeito e suas escolhas,
seus interesses e modos de interação.
Em linhas gerais, assumiu o caráter
“moral” do capitalismo através da ética protestante como matriz “moralizante”
das dinâmicas capitalistas. Seu discípulo é o típico malandrão que acredita ser o capitalismo o
mais eficaz modo de produção e social já criado. O devoto desse geralmente
defende um estado forte capaz de liderar o processo de construção nacional. Ainda
que o “capitalismo imperialista”, no qual o lucro resulta da violência política
coerciva e expansiva, produz “problemas” a um setor do capital, isto é, sem o
identifica-lo como uma fase do desenvolvimento do próprio sistema, trata esse fenômeno
como um ato isolado e natural.
Nessa visão jamais propõe uma
transformação da sociedade, mas sua legitimação. O que ele diz sobre
“poupança”, “atividade racional”, etc. opõe-se ao que Marx chamou, por exemplo,
de “acumulação primitiva do capital”.
O Foucaultiano pode ser ainda
mais intrigante. Esse sujeito é o verdadeiro tumor teórico dessa sub-esquerda hipster. Normalmente pinta
a realidade numa desconstrução racional da razão moderna e a formulação de uma proposição
política transgressiva viável à intervenção social de uma esquerda que no pós-68
(culminante após a Queda do Muro) que passa a descrer do socialismo, mas, se põe
romanticamente na postura rebelde e transgressiva contra o sistema. Esta rebeldia
de esquerda tipicamente adolescente resulta na condenação das forças de
contestação à ordem vigente a um fatalismo irremediável.
Isso sem falar na romantização
da pobreza e da exploração de classe, como fazem valer nas suas palavras de “gratidão pela vida bela e humilde”; e o
tal “socialismo cristão” (versão mal-arrumada da Teologia da Libertação) que encaixa
nesse minimalismo fajuto, pela qual quem produz o excedente material deve ter a
“consciência limpa” de suas “virtudes” (embora o cristianismo seja melhor
fundando ontologicamente que essa ideologia). Hoje em dia esses sujeitos se
vestem com roupagem “marxista”.
Resultado disso é o florescer
de todo tipo de oportunismo com uma concepção frágil que não viola o interior
do parco conhecimento da própria situação de classe e da realidade material. Não
atinge aqueles fundamentos que residem na propriedade privada, no capital (em
todas as suas formas de manifestação) e no Estado como produto histórico da
sociedade de classes que precisa ser superado no interior do processo de
transformação do trabalho assalariado em trabalho livremente associado.
Ao pintarem conjuntamente a “revolução”
como inviável ou dependente de uma “etapa” – como se a revolução comunista
fosse um “processo etapístico” da “dialética da vida”, não vão além de um mero
perfume em merda; pois, nisso se manipulam através de pressupostos contrários às
suas aspirações mundanas “abstratas”. Ou pior: a revolução seria coisa do passado, mesmo que a nossa realidade insista em dizer o contrário para esses sujeitos. A burguesia, para eles, pode até feder, porém, não se pode dinamitá-la!
Em comum eles têm “críticas”
pontuais a nossa sociedade (desde que não passe da aparência à essência da
mesma). Insistem num lixo abertamente subjetivista do “ponto de vista” eclético
e, ao mesmo tempo inútil (ainda que haja contribuições relevantes) que polui à
céu aberto a atmosfera social. Não foi à toa que Marx disse que “os filósofos até os dias de hoje se
limitaram a interpretar o mundo”, porque para transformá-lo é preciso,
antes de tudo, produzir teoricamente aquilo que se dispõe nas condições objetivas
da sociedade.
A ideia ingênua de alguma
mudança substantiva pode ocorrer no interior do Estado (e isso não significa
negar o Estado e suas dinâmicas) é puramente idealista – sempre irá naufragar
pelos imperativos da própria sociedade burguesa. O Estado, diferente do “ponto
de vista” é um complexo que tem como fundamento a propriedade privada (pensem
aí no direito à herança ou o casamento civil), sua existência está ancorada na
reprodução sóciometabólica do capital (extração da mais-valia para D–M–D’),
independentemente de política pública (“combater a corrupção” – moralismo pequeno-burguês),
econômica (taxar fortunas, por exemplo), etc.
Essas são variações no interior
da mesma ordem reprodutiva que reformá-lo é a síntese da miséria intelectual e
da pulsão genuinamente revolucionária. Como dizia Marighella: “A única luta que
se perde é a que se abandona”. E tem gente que nem começou ainda...
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